A questão da implantação da IFRS (normas internacionais de contabilidade) foi tratada por Marie Leone em IFRS Returns to the Front Burner, da revista CFO de 8 de outubro de 2009. Apesar do chefe do Iasb, David Tweedie ter afirmado que as diferenças estão resolvidas, existe muita crítica ainda. Principalmente em razão do prazo estabelecido, de 2014.
Quando lembramos que o Brasil decidiu e iniciou a implantação das normas em dois anos podemos questionar se as críticas são um excesso de zelo ou mostram que o nosso processo foi atropelado. Mas já em 2008 as grandes empresas de auditoria (Big Four), que segundo o texto são os maiores apoiadores da IFRS, começaram a incentivar a inclusão da IFRS no currículo de contabilidade nos EUA, através de programas de educação. E no último ano, a AICPA reconheceu o Iasb como regulador, com efeito sobre a opinião dos auditores nas demonstrações contábeis preparadas segundo as normas internacionais. Uma das críticas as normas internacionais é a excessiva flexibilidade, que afeta a comparabilidade e consistência entre os diferentes países. Entre os críticos, o CPA do estado de Nova Iorque, que inclui 30 mil membros. Outra crítica questiona a necessidade de adoção de normas internacionais para empresas que estão focadas no mercado interno. Fonte: Blog Contabilidade Financeira, César Tibúrcio
Comentário
Esta pressa na implantação da IFRS no Brasil associada à pouca discussão com vozes dissonantes é algo estranho. A "alta flexibilidade" na implantação das IFRS em cada país como bem comentando no post acima, não chegam nem perto do fato da própria "flexibilidade" das próprias normas, em especial as relacionadas à avaliação de ativos e passivos, notadamente no que se refere ao "valor justo", que vem sofrendo intensas críticas ao redor do mundo justamente pela incerteza de como tal "valor" deve ser mensurado. Prova disto é a "gritaria" das instituições financeiras e mais recentemente das seguradoras (Soberania Contábil).
Não podemos deixar de registrar que no EUA a migração às IFRS está sendo feita com mais cautela. Lá eles tem uma instituição normativa independente forte (FASB) que perderá muito com a delegação das normas ao IASB, o que tem levado ao embate com a SEC quanto ao cronograma de migração.
No Brasil nossas normas contábeis para companhias abertas vinham sendo expedidas pela CVM, endossando em sua grande maioria as normas do IBRACON. Hoje não mudou muita coisa, pois a CVM continua endossando normas, agora do CPC, este com forte influência do IBRACON. O problema é que não questionamos as normas. Se antes o IBRACON emitia normas adaptando algumas coisa do FASB (é só dar uma lida nos best seller de contabilidade e veremos que os comentários às normas brasileiras sempre vinham acompanhadas de comparações às normas do FASB), hoje traduz quase ao pé-da-letra as normas do IASB. Em nossos novos livros de contabilidade pouca menção se faz às normas do FASB.
Uma ruptura radical de paradigma normativo, com tão pouca resistência, que podemos sentir como se nenhuma houvesse. Não estou querendo dizer com isto que as normas do FASB eram as ideais para as companhias brasileiras, mas a nossa falta de direção científica na produção ou adoção de nossas normas contábeis é algo “interessante”.
Os contadores brasileiros apenas seguem o "cumpra-se" normativo, sem se darem conta que muita coisa tida hoje como boa novidade normativa, ou “nova contabilidade” já estava sendo alertado em meados da década de 70, quando da edição da 6.404/76 (A nova tão antiga contabilidade).
Enquanto nos EUA ocorre uma preocupação em se preparar os novos profissionais de contabilidade através de reformulação dos currículos acadêmicos, antes de chegar 2014, no Brasil as faculdades foram "pegas de surpresa". Várias teses, dissertações e artigos já vinham mostrando que não estávamos preparados para uma imediata convergência.
Na excelente tese de doutorado (FEA-USP), transformado no livro O BRASIL E A HARMONIZAÇÃO CONTÁBIL INTERNACIONAL: Influências dos Sistemas Jurídico e Educacional, da Cultura e do Mercado , da Drª Elionor Farah Jreige Weffort (Atlas/PWC, 2005), foi mostrado de forma bastante didática um aprofundamento, dentre outros, da influência do sistema educacional Brasileiro no processo de convergência/harmonização do Brasil às normas internacionais de contabilidade. Segundo concluiu a autora, o sistema educacional brasileiro não parecia favorecer aos esforços de harmonização internacional (p. 136-137), e isto foi publicado em 2005. Os dados coletados para pesquisa se limitaram até o ano de 2002. Temos, portanto uma grande quantidade de profissionais de contabilidade despreparados para a convergência. E poucos hoje estão sendo preparados para tal.
Só para terminar, ilustrando o parágrafo anterior - e sem deixar de ser ético, pois não revelarei nome - esta semana recebi um e-mail de um auditor-senior de uma das maiores companhias de auditoria, nos solicitando apoio na indicação de cursos sobre Sox, USGAAP e IFRS. É claro que fiz as devidas indicações de locais e livros que tratam do assunto. Mas o que me chamou a atenção foi o fato de que nem as próprias empresas de auditoria, que apóiam integralmente a implantação das IFRS, estão dando conta de treinar sua equipe de frente. Pergunto: como é que elas poderão emitir um parecer com segurança se não estão conseguindo treinar a contento seu quadro profissional? Talvez fosse a hora da CVM ser mais precisa quando faz críticas à qualidade dos pareceres de auditoria, pois parece que os problemas não estam apenas nas pequenas empresas de auditoria (vide post Puxão de Orelha 2 ).
Mais algumas postagem deste e de outros blogs sobre o assunto:
Comentário também postado em IFRS nos EUA>
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